terça-feira, 25 de maio de 2010

Surge um pouco de luz no fim do túnel

O STF condenou deputado federal, ex-prefeito, por malversação de verbas públicas. No caso, o réu não havia respeitado o objeto de convênio firmado pelo Município com o Ministério do Meio Ambiente. Eis o extrato do julgado, disponibilizado pelo Supremo Tribunal Federal:

Ação Penal: Prefeito e Desvio de Objeto de Convênio

Por reputar comprovadas a autoria e a materialidade do delito, o Tribunal, por maioria, julgou procedente pedido formulado em ação penal instaurada pelo Ministério Público Federal para condenar atual Deputado Federal à pena de 2 anos e 2 meses de detenção, convertida em duas penas restritivas de direito, consistente no pagamento de 50 salários-mínimos e prestação de serviços à comunidade, pela prática do crime tipificado no art. 1º, IV, do Decreto-lei 201/67 (“Art. 1º São crimes de responsabilidade dos Prefeitos Municipal, sujeitos ao julgamento do Poder Judiciário, independentemente do pronunciamento da Câmara dos Vereadores: ... IV - empregar subvenções, auxílios, empréstimos ou recursos de qualquer natureza, em desacordo com os planos ou programas a que se destinam;”). Entendeu-se que o parlamentar, na condição de prefeito do Município de Caucaia/CE, por vontade livre e consciente, aplicara na construção de passagens molhadas recursos transferidos pelo Ministério do Meio Ambiente ao Município, mediante convênio, destinados à construção de um açude público. Salientou-se que o convênio fora assinado pelo então prefeito, assim como todos os pedidos de alteração de prazo, feitos em diversos termos aditivos, havendo em todos eles cláusulas de ratificação do objeto inicialmente conveniado. Observou-se que o então prefeito, embora ocasionalmente transferisse a respectiva administração do Município à vice-prefeita, pessoalmente mantinha sob seu comando todos os incidentes contratuais relacionados com o convênio em causa. Afastou-se, por conseguinte, o argumento de que a ordem de alteração do objeto pactuado tivesse partido exclusivamente do então secretário de infraestrutura municipal, o qual, em juízo, dissera que pedira a alteração do objeto do convênio em obediência à ordem do então prefeito. Ponderou-se que, se o convênio e mais 7 termos aditivos foram todos assinados pelo acusado, não seria razoável aceitar a tese de que uma significativa alteração da finalidade principal do projeto tivesse sido apenas em decorrência da vontade pessoal do secretário do Município. Considerou-se, ademais, a existência de notas fiscais comprovando que, antes da sétimo termo aditivo do convênio, o Município pagara construtora para a construção de uma passagem molhada. Vencidos os Ministros Marco Aurélio e Cezar Peluso, Presidente, que julgavam procedente o pleito, mas aplicavam penas inferiores a 2 anos e, em conseqüência, decretavam a prescrição da pretensão punitiva à vista das penas em concreto, e os Ministros Dias Toffoli, Gilmar Mendes e Celso de Mello, que absolviam o réu, com base no art. 386, IV, do CP.
AP 409/CE, rel. Min. Ayres Britto, 13.5.2010. (AP-409)

quinta-feira, 20 de maio de 2010

O fato de alguém dirigir embriagado não presume a exposição de terceiros a risco?

Segue matéria extraída do Consultor Jurídico, que demonstra tendência jurisprudencial de exigência de demonstração de que a pessoa, além de estar embriagada, esteja dirigindo de forma anormal para a tipificação do crime do artigo 306 do CTB:

Bafômetro não é suficiente para abrir ação penal
Por Fabiana Schiavon

A comprovação de haver uma porcentagem de álcool no sangue superior à permitida pela Lei Seca não é suficiente para sustentar uma Ação Penal contra o motorista. Com esse entendimento, o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro arquivou um processo contra uma jovem de 20 anos, que dirigia sem causar riscos. A decisão desta quarta-feira (19/5) da 2ª Câmara Criminal é semelhante a outras decisões no estado. Em janeiro deste ano, a 8ª Câmara Criminal entendeu também que a denúncia tem de mostrar que o motorista dirigia de forma anormal, além dos testes do bafômetro.

Nesse caso, de acordo com os advogados do escritório Técio Lins e Silva & Ilídio Moura que cuidam do caso, a motorista estava visivelmente sóbria, quando foi abordada por uma blitz da Lei Seca. Ela fez o teste do bafômetro no local que constatou a existência de 0,45 decigramas de álcool por litro de sangue, quando o limite permitido é de 0,3. O Ministério Público ofereceu denúncia contra a mulher, atribuindo-lhe a prática do crime previsto no artigo 306, do Código de Trânsito Brasileiro, sob a alegação de que ela foi pega dirigindo com índices de álcool além do permitido. A 5ª Vara Criminal do Rio de Janeiro recebeu a denúncia e designou audiência para que o Ministério Público oferecesse proposta de suspensão condicional do processo. Com a decisão do TJ, a audiência não acontecerá.

De acordo com a advogada Maíra Fernandes, o recurso impetrado no TJ-RJ pedia que a Justiça considerasse a denúncia inepta visto que não basta o exame do bafômetro para iniciar um processo criminal. “A lei exige, para a configuração de um crime, que o motorista apresente uma conduta anormal, capaz de demonstrar que ele está, de fato, dirigindo sob influência de álcool e causando perigo a outrem”, explica. A defesa ainda insistiu que não houve exame clínico para confirmar a embriaguês, além de a moça não apresentar anormalidades enquanto dirigia.

Os desembargadores Antonio Jayme Boente e Claudio Dell Orto e Marcos Basilio acolheram a tese dos advogados e concederam parcialmente o Habeas Corpus. Ao invés de trancar a ação penal, eles decidiram arquivar o processo. De acordo com o pedido de Habeas Corpus, a Lei 11.705/08, “alterou o artigo 306 do Código de Trânsito Brasileiro, estabelecendo uma política mais repressiva, na medida em que, embora mantendo as mesmas penas da redação anterior, deixou de exigir, para a configuração do crime ali previsto, a caracterização de uma ação causadora de uma efetiva exposição “a dano potencial à incolumidade de outrem”. A defesa afirmou ainda que casos como esse da acusada pode sofrer, no máximo, uma penalidade administrativa.

Também atuaram no caso os advogados Técio Lins e Silva, Ilídio Moura, Darcy de Freitas, Letícia Jost Lins e Silva e Adriano Prata Almeida.

Caso semelhante
Em decisão semelhante da 8ª Câmara Criminal, o desembargador Gilmar Augusto Teixeira, afirmou que para existir o crime, além da beber quantidade maior de álcool, o motorista precisa se comportar de forma anormal enquanto dirige o veículo. O desembargador citou o advogado criminalista Luiz Flavio Gomes, que entende ser necessário, no processo penal, provar que além de estar embriagado, o motorista levou perigo a outras pessoas, ainda que estas não sejam concretamente identificadas. Teixeira citou o Recurso Especial 608.078, julgado pelo Superior Tribunal de Justiça, em que os ministros entenderam que o crime previsto no artigo 306 da Lei 9.503/97 (modificada depois pela Lei 11.705/08, conhecida como Lei Seca) demandava a demonstração de potencial lesão.

quinta-feira, 13 de maio de 2010

Improbidade Administrativa

Vencida a primeira batalha na funesta tentativa de derrubada da lei de improbidade administrativa, diploma legal de grande importância no combate à corrupção e desvio de verbas públicas. Eis a notícia:

Supremo julga improcedente ADI contra Lei de Improbidade Administrativa

O Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) considerou constitucional o trâmite da Lei de Improbidade Administrativa - Lei 8.429/92 – no Congresso Nacional. A norma foi questionada pelo Partido Trabalhista Nacional (PTN), que alegava que todo o texto seria inconstitucional por vício formal, tendo em vista que a lei teria sido sancionada sem ser submetida ao processo legislativo bicameral (Câmara e Senado), previsto no artigo 65, da Constituição.

Por maioria dos votos, os ministros julgaram improcedente a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 2182), pela manutenção da norma no ordenamento jurídico, vencido o ministro Marco Aurélio (relator). A Corte examinou a ação apenas sob o aspecto da inconstitucionalidade formal. Assim, o Plenário do STF considerou a norma questionada constitucional, sob o ângulo do processo de edição da lei, ao entender que o caminho percorrido pela lei no Congresso Nacional ocorreu sem vícios.

O artigo 65, da CF, no qual se fundamentou o partido para ajuizar a ação, determina que todo projeto aprovado em uma das Casas do Congresso Nacional deve ser revisto pela outra. O projeto poderá se tornar lei se a Casa revisora o aprovar. Se ela o rejeitar, o projeto deverá ser arquivado.

No dia 23 de maio de 2007, quando o Plenário iniciou o julgamento de mérito da matéria, o relator da ADI, ministro Marco Aurélio, entendeu que, no caso, o processo legislativo bicameral foi realmente violado. Ele argumentou que o projeto de lei foi encaminhado à Câmara dos Deputados pelo Executivo, onde foi aprovado. No Senado, ele teria sido totalmente modificado por meio de substitutivo. Ao voltar para a Câmara, o projeto teria sido mais uma vez modificado. Porém, em vez de ser arquivado ou voltar para o Senado (que atuaria como Casa revisora), o projeto foi encaminhado à sanção presidencial.

A ministra Cármen Lúcia Antunes Rocha e o ministro Ricardo Lewandowski abriram divergência e ressaltaram que a alteração realizada pelo Senado foi meramente formal, e não no conteúdo. Lewandowski entendeu que o projeto enviado pelo Senado Federal à apreciação da Câmara dos Deputados é meramente uma emenda e não um novo projeto de lei.

Na sessão desta quarta-feira (12), o ministro Eros Grau apresentou seu voto-vista, unindo-se à divergência. “A mim me parece que a Câmara dos Deputados deu estrito cumprimento ao disposto no artigo 65 da Constituição”, disse. No mesmo sentido votaram os ministros Ayres Britto, Gilmar Mendes, Celso de Mello e Cezar Peluso, que juntamente com os ministros Ricardo Lewandowski e Cármen Lúcia, formaram a maioria vencedora.

Aspecto material

Durante o julgamento, os ministros comentaram que o exame da constitucionalidade material da Lei de Improbidade Administrativa, ou seja, questionamentos quanto ao próprio texto da norma, será tratado no julgamento da ADI 4295, ajuizada pelo Partido da Mobilização Nacional (PMN).

FONTE: STF

terça-feira, 11 de maio de 2010

Reserva do Possível

Segue interessante julgado do Superior Tribunal de Justiça, onde foi enfrentada a recorrente questão apresentada pelos administradores públicos ao Poder Judiciário quando exigida a adoção de políticas púlbicas:

RESERVA DO POSSÍVEL. TESE ABSTRATA.


A tese da reserva do possível (Der Vorbehalt des Möglichen) assenta-se na idéia romana de que a obrigação impossível não pode ser exigida (impossibilium nulla obligatio est). Por tal motivo, não se considera a insuficiência de recursos orçamentários como mera falácia. Todavia, observa-se que a reserva do possível está vinculada à escassez, que pode ser compreendida como desigualdade. Bens escassos não podem ser usufruídos por todos e, justamente por isso, sua distribuição faz-se mediante regras que pressupõem o direito igual ao bem e a impossibilidade do uso igual e simultâneo. Essa escassez, muitas vezes, é resultado de escolha, de decisão: quando não há recursos suficientes, a decisão do administrador de investir em determinada área implica escassez de outra que não foi contemplada. Por esse motivo, em um primeiro momento, a reserva do possível não pode ser oposta à efetivação dos direitos fundamentais, já que não cabe ao administrador público preteri-la, visto que não é opção do governante, não é resultado de juízo discricionário, nem pode ser encarada como tema que depende unicamente da vontade política. Nem mesmo a vontade da maioria pode tratar tais direitos como secundários. Isso porque a democracia é, além dessa vontade, a realização dos direitos fundamentais. Portanto, aqueles direitos que estão intimamente ligados à dignidade humana não podem ser limitados em razão da escassez, quando ela é fruto das escolhas do administrador. Não é por outra razão que se afirma não ser a reserva do possível oponível à realização do mínimo existencial. Seu conteúdo, que não se resume ao mínimo vital, abrange também as condições socioculturais que assegurem ao indivíduo um mínimo de inserção na vida social. Sendo assim, não fica difícil perceber que, entre os direitos considerados prioritários, encontra-se o direito à educação. No espaço público (no qual todos são, in abstrato, iguais e cuja diferenciação dá-se mais em razão da capacidade para a ação e discurso do que em virtude de atributos biológicos), local em que são travadas as relações comerciais, profissionais e trabalhistas, além de exercida a cidadania, a ausência de educação, de conhecimento, em regra, relega o indivíduo a posições subalternas, torna-o dependente das forças físicas para continuar a sobreviver, ainda assim, em condições precárias. Eis a razão pela qual os arts. 227 da CF/1988 e 4º da Lei n. 8.069/1990 dispõem que a educação deve ser tratada pelo Estado com absoluta prioridade. No mesmo sentido, o art. 54, IV, do ECA prescreve que é dever do Estado assegurar às crianças de zero a seis anos de idade o atendimento em creche e pré-escola. Portanto, na hipótese, o pleito do MP encontra respaldo legal e jurisprudencial. Porém é preciso ressalvar a hipótese de que, mesmo com a alocação dos recursos no atendimento do mínimo existencial, persista a carência orçamentária para atender a todas as demandas. Nesse caso, a escassez não seria fruto da escolha de atividades não prioritárias, mas sim da real insuficiência orçamentária. Em situações limítrofes como essa, não há como o Poder Judiciário imiscuir-se nos planos governamentais, pois eles, dentro do que é possível, estão de acordo com a CF/1988, não havendo omissão injustificável. Todavia, a real insuficiência de recursos deve ser demonstrada pelo Poder Público, não sendo admitido que a tese seja utilizada como uma desculpa genérica para a omissão estatal no campo da efetivação dos direitos fundamentais, principalmente os de cunho social. Dessarte, no caso dos autos, em que não há essa demonstração, impõe-se negar provimento ao especial do município. Precedentes citados do STF: AgRg no RE 410.715-SP, DJ 3/2/2006; do STJ: REsp 1.041.197-MS, DJe 16/9/2009; REsp 764.085-PR, DJe 10/12/2009, e REsp 511.645-SP, DJe 27/8/2009. REsp 1.185.474-SC, Rel. Min. Humberto Martins, julgado em 20/4/2010.

sexta-feira, 7 de maio de 2010

Condenação - Transporte ilegal de lenha - Perda do caminhão

Segue importante julgado do TJMG confirmando sentença de 1º grau, oriunda da Comarca de Andrelândia, condenando o recorrente como autor de crime ambiental e decretando a perda do caminhão utilizado para transporte de lenha clandestina. Salvo engano, trata-se do primeiro precedente jurisprudencial de tal natureza, importantíssimo na luta diária contra os desmatamentos.

Número do processo: 1.0028.07.014561-1/001(1) Númeração Única: 0145611-19.2007.8.13.0028
Relator: ANTÔNIO ARMANDO DOS ANJOS
Relator do Acórdão: ANTÔNIO ARMANDO DOS ANJOS
Data do Julgamento: 09/02/2010
Data da Publicação: 16/04/2010
Inteiro Teor:
EMENTA: CRIME AMBIENTAL - ART. 46 DA LEI 9.605/98 - ABSOLVIÇÃO - IMPOSSIBILIDADE - RESTITUIÇÃO DO VEÍCULO APREENDIDO - INADIMISSIBILIDADE. 1. Restando satisfatoriamente comprovado que o agente adquiriu madeira para fins comerciais, sem a devida licença do vendedor e da autoridade competente, caracterizado está o crime do art. 46 da Lei 9605/98, não havendo que se falar em absolvição por ausência de provas. 2. De acordo com o previsto no parágrafo 4.º do art. 25 da Lei 9.6.05/98, restando comprovado nos autos, que o caminhão do agente era utilizado para prática de crimes contra o meio ambiente, correta a decisão que indefere o pedido de restituição e decreta o seu perdimento, como forma de mitigar a ação degradante pelo mesmo praticada. 3. Recursos desprovidos.

APELAÇÃO CRIMINAL N° 1.0028.07.014561-1/001 - COMARCA DE ANDRELÂNDIA - APELANTE(S): SEBASTIÃO JOSÉ DE PAULA - APELADO(A)(S): MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADO MINAS GERAIS - CO-RÉU: DOMINGOS NARDY - RELATOR: EXMO. SR. DES. ANTÔNIO ARMANDO DOS ANJOS

ACÓRDÃO

Vistos etc., acorda, em Turma, a 3ª CÂMARA CRIMINAL do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, sob a Presidência do Desembargador PAULO CÉZAR DIAS , incorporando neste o relatório de fls., na conformidade da ata dos julgamentos e das notas taquigráficas, à unanimidade de votos, EM NÃO PROVER OS RECURSOS.

Belo Horizonte, 09 de fevereiro de 2010.

DES. ANTÔNIO ARMANDO DOS ANJOS - Relator

NOTAS TAQUIGRÁFICAS

O SR. DES. ANTÔNIO ARMANDO DOS ANJOS:

VOTO

Perante o Juízo da Comarca de Andrelândia, SEBASTIÃO JOSÉ DE PAULA e Domingos Nardy, alhures qualificados, foram denunciados, o primeiro pela prática do crime previsto nos art. 46 da Lei n.º 9.605/1998, o segundo como incurso no art. 46, parágrafo único da mesma Lei.

Quanto aos fatos narra a denúncia de f. 02-03, que no dia 28.06.2007, atendendo a uma denúncia anônima, policiais militares se dirigiram para o estabelecimento comercial (depósito de madeiras) do denunciado Sebastião e lá abordaram o denunciado Domingos, transportando no caminhão MB/1113, placa BGZ-4398, cor amarela, de propriedade do denunciado Sebastião, e sob sua determinação, aproximadamente 16 (dezesseis) estéreos de madeira, da espécie candeia, sem estarem os acusados acobertados pela necessária licença ambiental.

Narra ainda a denúncia, que

"...o acusado Sebastião adquiriu a madeira acima descrita de terceira pessoa, bem como foi o autor do respectivo desmate, sem solicitar ou estar acobertado por qualquer licença expedida pelo órgão ambiental competente. Em seguida, determinou ao acusado Domingos que levasse a madeira cortada, no veículo acima citado, até seu depósito de madeiras (do acusado Sebastião), situado em Bom Jardim de Minas, para posteriormente revendê-la, com ou sem qualquer documento legal comprobatório da origem."

O representante do Ministério Público propôs ao réu Domingos Nardy o benefício da suspensão condicional do processo, mediante condições constantes da ata de audiência (f. 62-63) o que foi aceito pelo acusado e seu defensor, tendo MM. Juiz suspendido o processo pelo prazo de 02 (dois) anos.

Regularmente processado, ao final, sobreveio a r. sentença de f. 125-133, julgando procedente a pretensão punitiva Estatal, condenando o réu Sebastião José de Paula pela prática do delito previsto no art. 46 da lei 9.605/98 à pena de 09 (nove) meses de detenção, a ser cumprida em regime aberto, e ao pagamento de 40 (quarenta) dias-multa, no patamar mínimo legal, decretando a perda da madeira e do caminhão usado no transporte da mesma.

Inconformado com a r. sentença condenatória, a tempo e modo, apelou o réu (f. 136), buscando nas razões recursais (f. 137-138) a sua absolvição do delito pelo qual foi condenado por ausência de provas, já que apenas alugou o caminhão, o qual deve ser-lhe restituído.

Em contrarrazões (f. 140-143), o representante do Ministério Público, pugna pelo desprovimento do recurso.

O processo veio apensado com o incidente processual de restituição de coisa apreendida - Proc. n.º 1.0028.07.015018-1/001, no qual pleiteava a restituição do caminhão apreendido, indeferido pela decisão de f. 16, contra a qual foi interposto recurso de apelação, aos mesmos argumentos do que apenas alugou o caminhão e que sobrevive e sustenta sua família do transporte que faz com o referido caminhão.

O recurso do incidente foi contrariado pelo representante do Ministério Público, pugnando pelo seu desprovimento.

A douta Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer da lavra do Dr. Gilvan Alves Franco (f. 156-159), il. Procurador de Justiça opina pelo desprovimento do apelo.

No essencial, é o relatório.

Presentes os pressupostos de admissibilidade e processamento, conheço do recurso apresentado.

Não foram argüidos questionamentos preliminares e, não vislumbrando nos autos qualquer irregularidade que deva ser declarada de ofício, passo ao exame do mérito da apelação.

Como visto alhures, busca o apelante a absolvição ao argumento de que não há nos autos provas demonstrando a prática do delito que lhe foi imputado.

Registre-se, inicialmente, que a materialidade delitiva é inequívoca, restando sobejamente comprovada pelo boletim de ocorrência (f. 06-07), termo de depósito de f. 09, e laudo técnico de vistoria (f. 65-67). De igual modo, a autoria, resta incontroversa, diante do depoimento do apelado em consonância com as demais provas, senão vejamos:

O réu, no depoimento prestado perante a autoridade policial e confirmado em juízo (f. 100-101), relata:

"...que, na semana passada, comprou algumas madeiras de "candeia", da pessoa conhecida como JUAREZ, residente no Rio de Janeiro-RJ, não sabendo declinar o nome todo e o endereço correto do mesmo; que Juarez possui uma propriedade entre Liberdade e B. J. Minas, sendo que foi o próprio declarante quem cortou a madeira de propriedade, com a autorização de Juarez, que, o declarante alega que não tinha autorização do Instituto Estadual de Florestas para fazer o corte da madeira; que, cortou aproximadamente 08m3 da madeira conhecida por "candeia"; que o declarante pagou a quantia de R$350,00 (trezentos e cinquenta reais) pela madeira; que, que, o declarante mandou seu motorista, Domingos Nardy buscar a madeira na referida propriedade de Juarez e levá-la para o seu depósito (do declarante) em B. Jardim de Minas-MG; que, o declarante esclarece que iria deixar a referida madeira em seu depósito, para posteriormente vendê-la, sendo que ainda não tinha comprador para a mesma; que, o declarante alega que a referida madeira foi transportada da propriedade de Juarez até o depósito em B. J. Minas sem nota fiscal, sendo que não tinha autorização para o transporte da mesma; que o declarante alega que tem conhecimento de que precisa de licença do Instituto Estadual de Florestas para fazer o corte e o transporte da madeiras, mas esclarece que dessa vez não pediu, sendo que em vez que pede a licença e em outras vezes não pede, porque é muito trabalhoso; que nunca foi preso, mas já foi processado por crime ambiental" (f. 11-12).

Ressalte-se, que os policiais militares que participaram da ocorrência relataram que receberam denúncia anônima informando que um caminhão com carregamento de madeira chegaria ao estabelecimento do réu, diante disso foram para o local indicado. Passado algum tempo, chegou o caminhão do apelante e, ao fiscalizarem o veículo, foi localizado um carregamento de 16 (dezesseis) estéreos de lenha de madeira nativa "candeia" sem a devida documentação.

Logo, a conduta do apelante subsume ao tipo penal descrito no art. 46 da Lei 9605/1998 que dispõe:

Art. 46. Receber ou adquirir, para fins comerciais ou industriais, madeira, lenha, carvão e outros produtos de origem vegetal, sem exigir a exibição de licença do vendedor, outorgada pela autoridade competente, e sem munir-se da via que deverá acompanhar o produto até final beneficiamento:

Pena - detenção, de 6 (seis) meses a 1 (um) ano e multa.

Parágrafo único. Incorre nas mesmas penas quem vende, expõe à venda, tem em depósito, transporta ou guarda madeira, lenha, carvão e outros produtos de origem vegetal, sem licença válida para todo o tempo da viagem ou do armazenamento, outorgada pela autoridade competente.

Assim, restando comprovadas a materialidade e a autoria do art. 46 da Lei 9.605/98, não há que falar em absolvição, pois as provas coligidas aos autos, inclusive, o próprio depoimento do apelante, são conclusivas em apontá-lo como aquele que adquiriu madeira para fins comerciais, sem a devida licença do vendedor e da autoridade competente.

Sobre o assunto tem decidido este eg. Tribunal de Justiça:

"CRIME CONTRA O MEIO AMBIENTE - TRANSPORTE OU GUARDA DE CARVÃO VEGETAL SEM LICENÇA VÁLIDA PRA TODO O TEMPO DA VIAGEM - AUTORIA E MATERIALIDADE COMPROVADAS - CONDENAÇÃO MANTIDA - OBRIGAÇÃO DE RESTITUIR AS CARGAS APREENDIDAS PELO DEPOSITÁRIO FIEL. Comprovado que o réu transportava carvão mineral sem a licença válida para todo o tempo da viagem, outorgada por autoridade competente, impõe-se a condenação nas iras do art. 46, parágrafo único, da Lei 9.605/98. A obrigação de restituir as mercadorias apreendidas, ou o seu valor correspondente, cabe ao depositário fiel." (TJMG, 4.ª C.Crim., Ap n.º 1.0775.04.001096-6/001, Rel. Des. Walter Pinto da Rocha, v.u. j. 01.07.2007; in DOMG de 15.08.2007.)

"APELAÇÃO CRIMINAL - CRIME AMBIENTAL - TRANSPORTE DE MADEIRA SEM LICENÇA - CONDENAÇÃO LANÇADA - PRESCRIÇÃO POSSÍVEL - RECOMENDAÇÃO. Responde pelo delito previsto no art. 46, parágrafo único, da Lei 9.605/98 o agente que transporta madeira sem licença outorgada pela autoridade competente. Constatando-se que em função da pena aplicada nítida é a possibilidade de ocorrência da prescrição da pretensão punitiva, recomenda-se o seu reconhecimento tão-logo transitado em julgado o acórdão condenatório. Apelo provido e recomendação feita." (TJMG, 4.ª C.Crim., Ap 1.0175.02.000362-0/001, Rel. Des. Ediwal José de Morais, v.u. j. 25.10.2006; in DOMG de 11.11.2006.)

Assim, não restando qualquer dúvida quanto à autoria do delito descrito na inicial, pois as provas colhidas, aliadas aos indícios concatenadamente examinados, formam um conjunto probatório apto a apontar as apelantes como autoras do delito descrito na inicial, que além de não desconstituir as provas amealhadas em seu desfavor, não logrou êxito sequer para lançar a dúvida quanto à sua culpabilidade. Logo, impõe-se ser mantida a condenação imposta na sentença vergastada.

Por outro lado, no que diz respeito ao pedido de restituição do veículo (autos n.º 1.0028.07.015018-1/001), contra a decisão que indeferiu o pedido de restituição do veículo apreendido, a meu juízo, não merece acolhida a irresignação do apelante.

Sobre o assunto, dispõe o art. 25 da Lei 9.605/98:

"Art. 25 - Verificada a infração, serão apreendidos seus produtos e instrumentos, lavrando-se os respectivos autos.

[...]

§ 4.º Os instrumentos utilizados na prática da infração serão vendidos, garantida a sua descaracterização por meio da reciclagem"

Aliás, como bem ressaltado pelo Promotor de Justiça:

"Analisando o caso concreto, os antecedentes do imputado e as circunstâncias do crime, percebe-se que o caminhão ora apreendido tem importante papel nos negócios ilícitos do réu, porquanto o uso de veículo próprio permite ganhos mais significativos, e evita a contratação de fretes de terceiros e a maior exposição do réu a denúncias anônimas, etc.

[...]

E considerando que o réu tinha perfeita consciência de que necessitava de autorização para o corte/transporte de candeia, mas não solicitava por diversas vezes, aproveitando inclusive o período noturno (art. 15, II, "i", da Lei 9.605/98) para o escoamento do produto, pode-se afirmar que o réu vive na criminalidade, sendo seu veículo verdadeiramente um instrumento do delito (e não meramente um meio de trabalho honesto), em razão do que há de ser mantida a aplicação do disposto no art. 25, § 4.º da Lei 9.605/98, com a declaração de perdimento do caminhão apreendido e sua posterior venda..." (f. 141).

Ressalte-se, por oportuno, que a Constituição da República de 1.988, foi a primeira em nosso ordenamento a positivar a garantia de todos a um meio ambiente ecologicamente equilibrado, essencial não só às presentes como às futuras gerações (art. 225, "caput").

O objetivo do legislador constituinte em dar efetividade ao direito fundamental acima, o parágrafo 3.º do mesmo dispositivo constitucional dispôs que as condutas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, à sanções de natureza civil, administrativa e penal, o que evidencia a nítida intenção do legislador constituinte em maximizar a proteção do bem jurídico meio ambiente através da atuação em três esferas.

Com efeito, o parágrafo 4.º do art. 25 da Lei 9.605/98, veio garantir essa efetividade ao asseverar a perda dos instrumentos utilizados na prática do ilícito pelo agente, independentemente dos referidos instrumentos constituírem ou não fato ilícito de per si. A propósito, sobre o assunto, trago à colação o seguinte aresto:

PROCESSUAL PENAL. RESTITUIÇÃO DE COISA APREENDIDA. INSTRUMENTO DE DELITO AMBIENTAL. ART. 118, DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. ART. 25, DA LEI N.º 9.605/98.

1. Nos termos do art. 118 do Código de Processo Penal, as coisas apreendidas não poderão ser restituídas enquanto interessarem ao processo, mormente se houver dúvida se o requerente é terceiro de boa-fé.

2. O § 4.º, do art. 25, da Lei n.º 9.605/98, afastou a possibilidade de se restituir coisa que tenha servido como instrumento para a prática de crime contra o meio ambiente.

3. Apelação desprovida.

(TRF - 1.ª Região, 4.ª Turma, ApCrim. 200141000050079, Rel. Des. Federal I´talo Fioravanti Sabo Mendes, v.u., j. 01.05.2003, pub. DJ de 25.04.2003 p. 127.)

Logo, restando comprovado nos autos, que o caminhão era utilizado para prática de crimes contra o meio ambiente, correta a sua apreensão e perda em favor do Estado, na conformidade do previsto no § 4.º do art. 25 da Lei 9605/98, pois o douto sentenciante, por estar mais próximos dos fatos, bem avaliou a questão posta em julgamento, até porque, a alegação de que apenas alugou o caminhão e que dele retira o seu sustento, diante do seu depoimento,cai por terra, eis que dali se extrai ser o mesmos prospero comerciante de madeiras ilegais, cometendo, com outros caminhões de sua propriedade, desatinos contra o meio ambiente.

Fiel a essas considerações e a tudo mais que dos autos consta, meu voto é no sentido de se NEGAR PROVIMENTO aos recursos, mantendo a r. sentença por seus próprios e jurídicos fundamentos.

Custas ex lege.

É como voto.

Votaram de acordo com o(a) Relator(a) os Desembargador(es): FORTUNA GRION e JANE SILVA.

SÚMULA : RECURSOS NÃO PROVIDOS.

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE MINAS GERAIS

APELAÇÃO CRIMINAL Nº 1.0028.07.014561-1/001

terça-feira, 4 de maio de 2010

Pressões, pressões...

AGU processa procuradores envolvidos no caso Belo Monte

A Advocacia-Geral da União apresentou uma Reclamação Disciplinar no Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) contra o procurador da República Rodrigo Timóteo da Costa e Silva e o promotor de Justiça do Ministério Público do Estado do Pará, Raimundo de Jesus Coelho de Moraes. Segundo a AGU, os agentes tumultuaram a audiência pública em Belém, em que se discutia a construção da Usina Hidrelétrica de Belo Monte.
Segundo o documento, a participação popular no debate sobre a construção da Usina foi seriamente ameaçada pela conduta “irresponsável e insidiosa” de dois membros do Ministério Público. Para a AGU, o procurador e o promotor deveriam atuar desprovidos de qualquer ideologia, princípio ou interesse individual. “Quando da defesa de direitos fundamentais, não há que se conceber uma atuação, pelo membro do Ministério Público, de forma parcial e movida por convicções estritamente individuais, desvinculadas daquilo que se denomina interesse público”, explica a AGU na peça.
Durante a audiência pública, segundo a AGU, o promotor de Justiça do Pará, Raimundo Moraes, incitou a população presente a abandonar o evento e fazer um ato público de repúdio na área externa. Instigados pelos dois representantes dos Ministérios Públicos, grande parte dos participantes também deixou a sala. “Não é dado ao membro do MP, a quem compete, como fiscal da lei, zelar pela higidez do procedimento, atuar com o objetivo de esvaziar a audiência pública, conclamando os presentes a se retirarem do local. O membro do MP deve participar ativamente do ato coletivo, sendo tal requisito essencial para o adequado exercício de suas atribuições”, defende a AGU.
Outro lado
A Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR) repudia a atitude da AGU em protocolar representação contra membros do Ministério Público. Para a entidade, a iniciativa da AGU é uma tentativa de intimidar o trabalho exercido de forma legítima pelo MP. No caso de Belo Monte, a ANPR afirma que o Ministério Público usou apenas as prerrogativas legais cabíveis. Para o presidente da entidade, Antonio Carlos Bigonha, todo processo foi pautado sobre uma análise impessoal, objetiva e cuidadosa, resultado do acompanhamento, por quase treze anos, de inúmeras discussões que vêm sendo travadas e da qual participaram diversos membros do MPF e de suas instâncias internas de coordenação e revisão. “Ao contrário do que a AGU vem divulgando, não houve quebra da impessoalidade e da isenção que se exige dos agentes públicos”, ressalta Bigonha. Com informações da Assessoria de Imprensa da AGU e da ANPR.