quarta-feira, 29 de julho de 2009

Há parlamentares em Brasília

Caros amigos,

a notícia que segue traz esperança. Na esteira dos ares da Constituição de 1988, foi montado no Brasil o edifício do "garantismo à brasileira", estranha corrente da dogmática penal e processual penal que enxerga nas normas penais apenas o viés da proibição do excesso, mas que se esquece do outro lado, da proibição da proteção deficiente. Esquecimento que deu muitos frutos, pois na atual dogmática penal é difícil encontrar algum autor que não seja "garantista à brasileira" (ou seja, aquele que se esquece da vertente da proibição da proteção deficiente), há um instituto criado exclusivamente para defender tais ideais (IBCCRIM) e nossa Suprema Corte parece ter aderido de vez aos encantos da referida doutrina (tal assunto será objeto de uma coluna específica).

Mas de onde menos se espera, surge alguma coisa. Vejam a notícia abaixo. Nunca pensei que fosse escrever isso, mas, parafraseando a famosa afirmação feita no conto de François Andrieux, O Moleiro de Sans-Souci... há parlamentares em Brasília!

Segue a notícia:

Relator dá aval a PEC contra progressão de regime

Em análise na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados, a Proposta de Emenda Constitucional que tirará de condenados por crimes hediondos o direito a progressão de regime prisional já tem apoio do seu relator na comissão. O deputado Ciro Nogueira (PP-PI) afirmou que recomendará a aprovação da PEC 364/09. A PEC, de autoria do deputado Valtenir Pereira (PSB-MT) — que também é defensor público —, determina o cumprimento da pena em regime fechado, do início ao fim, para o sentenciado por crimes de estupro, sequestro, atentado violento ao pudor, tortura, tráfico de drogas e terrorismo. Assim, o preso terá de cumprir a pena sempre em regime fechado, não podendo passar para o semiaberto ou o aberto.
"Hoje, 90% dos crimes hediondos são cometidos por reincidentes. Há muitos psicopatas que tiveram o benefício da progressão do regime e voltaram a delinquir. Eles sabem que, mesmo condenados, cumprirão apenas uma parte da pena na cadeia", diz o deputado Ciro Nogueira. "Devolver esse tipo de criminoso à sociedade antes do tempo previsto é contrário ao que a sociedade deseja, causando sensação de impunidade e estímulo ao crime", afirma o deputado Valtenir Pereira.
Se for promulgada, a PEC irá restaurar uma sistemática abolida pelo Supremo Tribunal Federal. Por 6 votos a 5, a corte decidiu conceder a progressão a um condenado por molestar três crianças, ao considerar inconstitucional o dispositivo da Lei 8.072/90 que excetuava o benefício para sentenciados por crimes hediondos e semelhantes.
A maioria dos ministros do STF considerou que negar a condenados por crimes hediondos a progressão de regime é incompatível com o princípio constitucional da individualização da pena de acordo com as peculiaridades de cada pessoa. Em outras palavras, o tribunal entendeu que a proibição tinha o efeito de uniformizar o tratamento a todo e qualquer condenado por crime hediondo.
Assim, presidiários com mau comportamento ou com comportamento exemplar, reincidentes ou não, seriam equiparados. Por outro lado, mesmo sem ter direito à progressão, os condenados por crimes hediondos podiam, observados os requisitos legais, obter o livramento condicional após o cumprimento de mais de 2/3 da pena — uma aparente contradição, segundo o STF. Esse benefício, porém, não vale para o condenado por crime hediondo reincidente.
Após essa decisão, o Congresso aprovou o projeto que deu origem à Lei 11.464/07, elevando a fração mínima da pena a ser cumprida pelos condenados por crimes hediondos para terem direito à progressão de regime: 2/5 para primários e 3/5 para reincidentes. A regra vale apenas para as infrações cometidas após a edição da lei. Por isso, grande parte dos condenados por crimes hediondos está passando para o regime semiaberto após 1/6 da pena, como os demais presos.
Contrário ao entendimento do STF, Valtenir Pereira afirma que a individualização da pena não é feita por meio do ajuste de sua duração, mas pela sua adaptação às necessidades de correção do detento. O deputado lembra que a lei já prevê, inclusive, o "estudo criminológico", que serve para fazer um diagnóstico do preso e dar subsídios à formatação de uma pena eficiente para a sua recuperação.
Ele também alega não ser correto o entendimento de que o condenado por crime hediondo deve ser libertado antes de cumprir toda a pena. "O bom comportamento carcerário não significa, necessariamente, que o preso está apto a uma boa convivência com a sociedade. Conceder a progressão como estímulo ao delinquente não se justifica, pois é obrigação do indivíduo cultivar bom comportamento em toda sua vida", afirma.
Além disso, ele argumenta que a proteção da sociedade deve prevalecer contra o direito do preso. A progressão de regime para presos por barbaridades, segundo o deputado, deu oportunidade à reincidência, como no caso do garoto Kaytto Guilherme Nascimento Pinto, de 10 anos, violentado e morto por um condenado por crime hediondo liberado do regime fechado. "O Poder Público não deve existir para defender interesses particulares ou de alguns e, sim, a vontade geral", diz. Com informações da Agência Câmara

Fonte: Conjur

Fiquem à vontade para comentar.

Um comentário:

Sérgio Soares disse...

Caro Vinícius, lamentavelmente percebo que as forças defensoras do já chamado "garantismo à brasileira" estão bem organizadas, havendo como bem lembrado por você, até mesmo um instituto jurídico visando a disseminação de suas idéias (IBCCRIM). Creio que não podemos ceder a exageros, seja para um lado ou outro. A situação atual exige dos operadores do direito uma postura séria, condizente com o triste sentimento de impunidade que reina entre a população, decorrente, em grande parte, das concessões de habeas corpus sempre que um preso que não se enquadre nas famosas categorias do "P.P.P." se vê atingido por justas ações!