segunda-feira, 16 de novembro de 2009

A controversa extradição de Cesare Battisti

Segue interessante entrevista do Min. Marco Aurélio Mello, que além de abordar aspectos técnicos do julgamento da extradição de Cesare Battisti, defendendo seu voto, também teceu considerações quanto ao papel que o Supremo Tribunal Federal tem desempenhado no Brasil. Vejamos:

Lula não é obrigado a entregar Battisti à Itália

O ministro Marco Aurélio Mello, do Supremo Tribunal Federal, afirma que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva pode expulsar o o ex-ativista Cesare Battisti, mas não é obrigado a entregá-lo para a Itália, mesmo que a Corte autorize sua extradição.

Em entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo, ele disse estar preocupado com os avanços do Supremo que não conta com um órgão que possa “corrigir” suas decisões. Também para ele, está havendo uma precipitação no julgamento com a afirmação de que o presidente está obrigado a entregar Battisti ao governo italiano. "Quem conduz a política internacional não é o Supremo, não é o Judiciário, é o Executivo."

Leia a entrevista:

No seu voto, o senhor chegou a mencionar a ditadura no Judiciário.É. E citei o Canotilho (professor português de direito constitucional José Joaquim Gomes Canotilho), que se mostrou perplexo com os avanços do Supremo. Pelo fato de nós não termos acima um órgão que possa corrigir as nossas decisões, nós precisamos ter uma responsabilidade maior. Não podemos avançar, não podemos atropelar.

Qual é a opinião do senhor sobre o fato de o STF ter analisado o ato do ministro da Justiça, Tarso Genro, de ter concedido refúgio a Cesare Battisti?Para mim, está havendo atropelo quanto ao exame em profundidade do ato de refúgio. Isso nunca ocorreu no Supremo, é a primeira vez. E quanto ao voto do relator, que assenta que o presidente da República estará obrigado a entregar o extraditando. Agora mesmo o presidente Sarkozy, da França, em relação a uma italiana que a corte declarou a legitimidade do pedido de extradição, ele concedeu o asilo. Por quê? Porque o asilo e o refúgio estão no grande todo que é a política internacional. Quem conduz a política internacional não é o Supremo, não é o Judiciário, é o Executivo. E a nossa Constituição, nossa República, está assentada na separação dos Poderes. Os Poderes são independentes e harmônicos. Reconheço que meu voto foi um pouco duro. Mas precisamos perceber que não somos infalíveis, não somos os censores da República de uma forma geral. A nossa atuação é vinculada ao direito posto, à Constituição Federal.

O senhor tem notado um movimento do tribunal, de avanço nas atribuições dos outros Poderes?
Tenho notado que prevalece um pragmatismo muito grande. Nesta quinta-feira (12/11) mesmo eu comecei levantando uma questão de ordem. Pelo regimento, está em bom vernáculo que para julgar matéria constitucional temos de ter oito ministros no plenário. Iniciamos a sessão com sete. E depois do lanche, tínhamos seis. E aí, como eu sou um homem que quando assume compromisso eu honro, eu tinha um compromisso em São Paulo na FMU, eu tive de sair. Chego lá (no plenário do STF) no horário certo, às 14 horas. Mas estamos começando as sessões com 30, 40 minutos de atraso sempre. E os intervalos se projetando por 1 hora e 15 minutos, 1 hora e 20, enquanto o regimento prevê 30 minutos. Aí não conseguimos julgar realmente o que desejaríamos julgar.

Na opinião do senhor, o STF está se transformando num superórgão, acima dos outros Poderes?Eu penso, como sinalizado pelo professor Canotilho, que talvez diante de uma certa inércia, principalmente do Legislativo, o tribunal tende a avançar. Agora, é o que eu digo: um suspiro dentro do tribunal é observado por todos. E o exemplo vem de cima. Se nós queremos a observância das regras jurídicas, nós temos de dar o exemplo. No fim da sessão desta sexta, o ministro Gilmar Mendes deu um recado, dizendo que o presidente tem de cumprir as decisões judiciais.
Não é bem assim. A nossa decisão na extradição, se positiva quanto ao pedido do governo requerente, é simplesmente declaratória. Nós declaramos a legitimidade do pedido para o presidente da República aí decidir se entrega ou não. Agora, se a nossa decisão é negativa, dizendo que o pedido é ilegítimo, essa decisão negativa obriga o presidente da República. Ele não pode entregar o extraditando.

O que ele pode fazer, que é um outro ato, é expulsar o estrangeiro. Mas não entregar ao governo requerente. Pela primeira vez, no voto do relator, ele está consignando que o presidente da República é obrigado a cumprir e entregar. Não é bem assim.

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